sábado, 18 de abril de 2015

Não podemos deixar morrer o Lince Ibérico! (outra vez)

A 25 de Fevereiro de 2015, foi libertado o terceiro casal de Lince Ibérico (Lynx Pardinus) em território nacional, a primeira meia dúzia desde a extinção da espécie do nosso lado da fronteira, na década de 90. A 12 de Março, Kayakweru, a fémea desse casal, foi encontrada morta, sem causa exterior aparente. Um mês depois, veio a público a causa da morte de um dos felinos mais ameaçados do mundo: envenenamento.

Foi breve a vida em liberdade de Kayakweru. Ela nasceu em território nacional, perto de Vale Fuzeiros, uma pequena localidade montanhosa no concelho de Silves, no Algarve, em 2013, fruto do trabalho de conservação empreendido pelo Centro Nacional de Reprodução do Lince Ibérico (CNRLI), que desde 2009, cria e prepara estes animais para a sua futura introdução em habitat natural. Lá, como nos restantes 4 centros do programa de conservação Ex-situ do Lince Ibérico (todos em Espanha), constrói-se todos os dias, uma parte crucial do futuro desta espécie, um futuro que se quer de recuperação, em oposição à extinção, que apesar dos progressos feitos nos últimos 10 anos, teima em não sair do horizonte.  


Foi breve a vida em liberdade de Kayakweru. Terminou-a um acto criminoso: a utilização de veneno como forma de extermínio, proibida por lei em Portugal1. Apesar de o mal estar feito, e de um precioso animal, raro, único e nosso (de Portugal e Espanha), ter morrido por acção humana, é preciso entender que esta morte não é, nem pode ser considerada, apesar das dificuldades inerentes a um projecto de conservação desta natureza, uma situação “normal”, “espectável” ou “aceitável”. Urge distinguir, morte acidental causada por mão humana, como infelizmente já aconteceu em Espanha, um atropelamento numa estrada não iluminada, de morte criminosa, causada pela utilização de substâncias ilegais para o efeito pretendido: matar. 

É igualmente inaceitável a inércia e condescendência das nossas instituições que, perante um problema recorrente em Portugal (a morte por envenenamento de vida selvagem), tardam em aplicar metodologias que previnam (como a educação para a temática e o maior envolvimento dos sectores económicos com mais impacto nestas problemáticas), fiscalizem, investiguem e punam os responsáveis por tais actos. 

Revolta-me a falta de gestão estratégica de recursos, o gasto de tantos milhões de euros em preservar o ambiente e as espécies autóctones, porque (espera-se) se reconhece o valor ambiental, cultural e económico de espécies como esta, para depois deixar ao acaso, e sem qualquer tipo de meio de prevenção, de monitorização ou de intervenção, que permita actuar legalmente contra os culpados quando os “azares” acontecem.


Revolta-me que um ministro do ambiente (e provavelmente o engenheiro electrotécnico com mais impacto na conservação ambiental em Portugal) que se dá ao trabalho de ir soltar uma promessa eleitor… um animal em vias de extinção, não trabalhe com o seu ministério em soluções preventivas e correctivas para este tipo de situações, não garanta que este, como tantos outros casos semelhantes no nosso país, não acaba arquivado e esquecido sem consequências para os culpados e não se pronuncie sobre o assunto, deixando aos que trabalham directamente nesta área e a todos os cidadãos que, não o fazendo, apoiam, divulgam e se indignam (e benditos sejam) com este tipo de passividade para com actos criminosos, nada mais do que a esperança de que no futuro, num dia de nevoeiro, alguém em posição para fazer essa diferença, faça o trabalho que lhe compete: zelar pela conservação do nosso património natural, pela boa gestão do dinheiro investido na sua preservação, e acima de tudo, pela não complacência para com actos criminosos.

Deixem lá o nevoeiro, queremos os nossos bichos de volta!

Nuno Soares 

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