A 25 de Fevereiro de 2015, foi libertado o terceiro casal de Lince
Ibérico (Lynx Pardinus) em território
nacional, a primeira meia dúzia desde a extinção da espécie do nosso lado da
fronteira, na década de 90. A 12 de
Março, Kayakweru, a fémea desse casal, foi encontrada morta, sem causa
exterior aparente. Um mês depois, veio a público a causa da morte de um dos
felinos mais ameaçados do mundo: envenenamento.
Foi breve a vida em liberdade de
Kayakweru. Ela nasceu em território nacional, perto de Vale Fuzeiros, uma
pequena localidade montanhosa no concelho de Silves, no Algarve, em 2013, fruto
do trabalho de conservação empreendido pelo Centro Nacional de Reprodução do
Lince Ibérico (CNRLI), que desde 2009, cria e prepara estes animais para a sua
futura introdução em habitat natural. Lá, como nos restantes 4 centros do
programa de conservação Ex-situ do
Lince Ibérico (todos em Espanha), constrói-se todos os dias, uma parte crucial
do futuro desta espécie, um futuro que se quer de recuperação, em oposição à
extinção, que apesar dos progressos feitos nos últimos 10 anos, teima em não
sair do horizonte.
Foi breve a vida em liberdade de
Kayakweru. Terminou-a um acto criminoso: a utilização de veneno como forma de
extermínio, proibida por lei em Portugal1. Apesar de o mal estar
feito, e de um precioso animal, raro, único e nosso (de Portugal e Espanha),
ter morrido por acção humana, é preciso entender que esta morte não é, nem pode
ser considerada, apesar das dificuldades inerentes a um projecto de conservação
desta natureza, uma situação “normal”, “espectável” ou “aceitável”. Urge
distinguir, morte acidental causada
por mão humana, como infelizmente já aconteceu em Espanha, um atropelamento
numa estrada não iluminada, de morte
criminosa, causada pela utilização de substâncias ilegais para o efeito
pretendido: matar.
É igualmente inaceitável a
inércia e condescendência das nossas instituições que, perante um problema
recorrente em Portugal (a morte por envenenamento de vida selvagem), tardam em
aplicar metodologias que previnam (como a educação para a temática e o maior
envolvimento dos sectores económicos com mais impacto nestas problemáticas),
fiscalizem, investiguem e punam os responsáveis por tais actos.
Revolta-me a falta de gestão estratégica
de recursos, o gasto de tantos milhões de euros em preservar o ambiente e as
espécies autóctones, porque (espera-se) se reconhece o valor ambiental,
cultural e económico de espécies como esta, para depois deixar ao acaso, e sem
qualquer tipo de meio de prevenção, de monitorização ou de intervenção, que
permita actuar legalmente contra os culpados quando os “azares” acontecem.
Revolta-me que um ministro do
ambiente (e provavelmente o engenheiro electrotécnico com mais impacto na
conservação ambiental em Portugal) que se dá ao trabalho de ir soltar uma
promessa eleitor… um animal em vias de extinção, não trabalhe com o seu
ministério em soluções preventivas e correctivas para este tipo de situações,
não garanta que este, como tantos outros casos semelhantes no nosso país, não
acaba arquivado e esquecido sem consequências para os culpados e não se
pronuncie sobre o assunto, deixando aos que trabalham directamente nesta área e
a todos os cidadãos que, não o fazendo, apoiam, divulgam e se indignam (e benditos
sejam) com este tipo de passividade para com actos criminosos, nada mais do que
a esperança de que no futuro, num dia de nevoeiro, alguém em posição para fazer
essa diferença, faça o trabalho que lhe compete: zelar pela conservação do
nosso património natural, pela boa gestão do dinheiro investido na sua
preservação, e acima de tudo, pela não complacência para com actos criminosos.
Deixem lá o nevoeiro, queremos os
nossos bichos de volta!
Nuno Soares
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