É este o título de um livro de Zygmunt Bauman, que ando a ler.
O velhinho sociólogo e filósofo polaco que morreu em
Janeiro deste ano, deixou uma vasta obra que expõe a face desumana do
capitalismo, numa posição bastante crítica à pós-modernidade. Mas tem uma forma
de escrever, complexa é verdade, mas próxima da linguagem das pessoas comuns –
o que me agrada.
Ficou mundialmente conhecido pelo seu conceito de Modernidade Liquida, onde defende que as
ideias de emancipação, individualidade, tempo/espaço, trabalho e comunidade
estavam a mudar com rapidez e de forma imprevisível.
A sua noção de liquidez é aplicada aos mais variados
temas como as relações entre os indivíduos, o medo, o amor, a vida e o tempo.
Na sua obra Amor
Liquido, as relações amorosas deixam de ter aspecto de união e passam a ser
um mero acumular de experiências, sendo a insegurança parte estrutural da
constituição do sujeito pós-moderno e a fluidez, uma espécie de facilidade que
faz com “as relações escorram pelos dedos”.
Ele faz uma oposição, no que respeita à questão da
construção identitária, dizendo que o problema da identidade moderna era o de
construir uma identidade sólida e estável, em estado durável; enquanto o
problema da identidade pós-moderna é o de como evitar a fixação e manter as
opções em aberto, numa identidade em projecto, procurando saber, em cada tempo
e em cada espaço, onde nos colocamos, na variedade de estilos e de modos.
Passe a simplificação do seu pensamento complexo, esta
é uma ideia que me interessa. Como também me interessam as 4 estratégias da
vida pós-moderna que ele identifica.
À vida moderna como Peregrinação, em conflito com o lugar (conflito herdado da cultura
judaico-cristã), num recomeço perpétuo a caminho de um destino que, apesar de
tudo, tem confiança na linearidade e cumulatividade do Tempo, ele contrapõe 4
sucessores do Peregrino:
· O Deambulador,
que tem a cidade como seu covil;
· O Vagabundo,
sem senhor e sem itinerário;
· O Turista,
que nunca é parte de um lugar e é um caçador de experiências movido por
critérios estéticos;
· O Jogador,
num mundo maleável e com ‘golpes de
sorte’, onde há apenas movimentos, mais ou menos inteligentes, perspicazes
ou desorientados.
Esta leitura de Zygmunt Bauman aumenta inquietações mas também reforça convicções
no sentido de uma apropriação mais inteira no espaço e no tempo da vida que
vivo. Com uma ideia de construção de uma sociedade melhor, da qual não abdico.
Os “residentes
instalados”, como ele lhes chama, descobrem que os lugares (na terra, na sociedade
e na vida) aos quais pertencem já não existem ou já não os protegem: as ruas
estão ameaçadoras, as fábricas e empregos desaparecem todos os dias, as
competências já não servem, os saberes tornam-se ignorância, a experiência
profissional torna-se um ónus e as redes de relações seguras desfazem-se.
Não é fácil superar a perplexidade que
estas condições induzem. Mas a existência privatizada propõe imensas
satisfações e algumas penas. Das primeiras salienta: a liberdade de escolha, a
oportunidade de tentar múltiplos estilos de vida, a ocasião para cada pessoa se
fazer à medida da imagem que faz de si própria; das segundas: a solidão e a
incerteza em relação às escolhas feitas e por fazer.
A identidade, vista como a linha
divisória entre a identidade socialmente reconhecida e a identidade imaginada a
título individual, não esquece a ‘necessidade
de pertença’ como membros de uma comunidade maior.
E aqui surge a comunidade, agora saudada
como expressão das formas de vida herdadas, como repositório de culturas e
tradições novamente valorizados. E novamente idealizados.
O pensamento social, diz ele, sempre foi
dado a repetir histórias.
Podemos dizer que a maior parte das
atividades da nossa vida tendem hoje a ser fragmentadas, episódicas e sem
consequência. Uma colecção de acontecimentos, cada um deles desligado dos
outros – “os escândalos e demonstrações
de incapacidade que invadem a atenção do público tem a qualidade de fazer
desaparecer da memória os escândalos e demonstrações de incapacidade do passado”.
Vivemos em sociedades fortemente
marcadas pelo conflito entre ter e ser, nas quais nos expressamos pelo que
temos, sendo as posses que se
transformam em elementos definidores da identidade.
O modo como as cidades se dividem é
exemplo dessa busca pela conformidade que segrega o que é diferente, estranho.
Os muros que construímos, físicos ou emocionais, têm esse condão de isolar e
criar lados, o de dentro e o de fora. Onde o espaço de fora é lugar cativo dos
que nos incomodam, pessoal e/ou socialmente.
A humanidade contemporânea tem uma
questão central por resolver, segundo ele, que é a de harmonizar a diversidade
em polis reinventadas.
Precisando para isso de transformar
consumidores em construtores,
cidadãos persistentes e responsáveis e de “uma
comunidade política de pleno direito, capaz de auto-reflexão e de si corrigir a
si própria, por outro.”
Destas leituras complexas que faço em modo
vadio, destaco uma mensagem simples – amar é uma ato revolucionário, uma nota
de solidez e coragem que nos impulsiona e ser melhores como pessoas e como
sociedades
E como a vida são dois dias, e o
Carnaval
que se aproxima são três, achei que era um bom mote para tornar a vida menos
fragmentada.
Isabel Passarinho
O Carnaval é
uma festa de origem pagã com origem na Grécia antiga para agradecimento aos
deuses e associada a música e disfarces. Na versão gaulesa, era a grande festa
do Inverno que promovia a brincadeira e a estravagância.
Em 590 d.C.foi uma comemoração adoptada pela Igreja Católica, antes da
Quaresma. Tradicionalmente marcava o jejum, com abstinência de alimentos de
origem animal, em particular o ‘adeus à carne’.
O Carnaval tem 3 dias ‘gordos’ em contraste com o tempo de reflexão
espiritual, penitência e privação instituído pela Quaresma.